terça-feira, abril 29, 2014

A Morte de D.G., a UPP e a hipocrisia do sistema

A morte do dançarino DG, na comunidade do Pavão Pavãozinho, zona sul do Rio de Janeiro, põem as UPP’S, mais uma vez, no centro do debate sobre sua eficácia.
Vou começar pela hipocrisia, ou pelo show, promovido pelas diversas declarações sobre o acontecido. O noticiário está cheio de afirmações sem a menor sustentação factual, apenas opiniões altamente emocionais de um lado, outras nitidamente já querendo defender a ação policial, outras querendo usar na disputa politica eleitoral e ainda as pressões internacionais questionando se o Brasil tem condições de oferecer segurança para Copa do Mundo.
As declarações, do Secretário Estadual de Segurança do Estado do Rio de Janeiro José Mariano Beltrame, demonstram claramente sua concepção de guerra, onde erros e mortes fazem parte do processo, ou seja, são meras estatísticas inseridas em busca do objetivo maior, a guerra contra o tráfico.  A questão central, da pseudo guerra, é que entre a policia e os traficantes existem moradores, trabalhadores, jovens, mulheres e crianças inocentes, que sempre são atingidas por “balas perdidas”. Esta população sobrevive à violência da policia de um lado e a do tráfico do outro.
A estratégia de ocupação territorial pelo Estado, conhecida popularmente como Unidade de Policia Pacificadora-UPP, inicia suas ações pela ocupação militar, seja estadual ou federal, para depois “introduzir políticas públicas mais estruturantes”. O seu primeiro ciclo de execução, que compreendeu “pacificar” o Complexo do Alemão, as comunidades do entorno do Maracanã, as comunidades da zona sul e o Complexo da Maré, está concluído. Embaladas pelas mortes que já não são isoladas, pela invasão dos bandidos foragidos para outros bairros e ou cidades ao redor do município do Rio de Janeiro e por motivações politicas, culminam por terminar a lua de mel entre sociedade e a politica de segurança pública de Cabral e Pezão.
O segundo ciclo começou fundamentalmente em função das mobilizações de 2013 que obrigaram o governo estadual a ampliar a zona de ocupação dentro do município do Rio de Janeiro, ampliar para baixada fluminense e para Niterói. Este movimento precisa ser acompanhado da efetiva aplicação de politicas publicas estruturantes que melhorem a qualidade de vida dos moradores dessas comunidades, pois até agora, na maioria das ocupações, o que chegou foi o braço armado do aparelho de Estado. Antes que usem o Complexo do Alemão para afirmar que politicas estruturantes existem, quero lembrar que existem só no Alemão, ainda falta muito para atingir toda comunidade e boa parte foi realizado com verba federal.
As imagens das forças de ocupação botando a bandidagem no Complexo do Alemão para correr representou um sopro de esperança para todos os cariocas. Este sopro de esperança está ameaçado, não só pela bandidagem, mas também por uma pitada de ingenuidade. Como é possível acreditar que, depois do Alemão, todas as ocupações da UPP aconteceram sem uma troca de tiros, foi “pacífico”? Aqui reside uma máxima, muito utilizada para ganhar a opinião publica: “o direito de ir e vir”. O objetivo inicial era acabar com a livre circulação e ostentação de armas de fogo no interior das comunidades e com isso os moradores sentirem o sabor de caminhar sem medo pelas ruas, vielas e becos. Não nego que isso seja uma importante conquista, mas não sou desses que acham isso a nona maravilha do mundo. O tráfico não acabou, continuou o comercio de drogas, as bocas continuaram funcionando e a violência assumiu novas formas. Se os bandidos foram postos para correr, quem assumiu a gerência?
A morte do DG para alguns foi uma fatalidade, para outros azar, estava no lugar errado na hora errada, para outros incautos ele estava fugindo da policia, pulando muros (está versão foi da mídia). Sinceramente, não me importa o que ele estava fazendo lá. Eu sei que o sobrenome dele era Silva. Quantos Silvas morrem diariamente e silenciosamente no Rio de Janeiro e quantos ainda irão morrer?

Para encerrar está primeira parte não posso deixar de fazer um breve comentário sobre o show de hipocrisia neste domingo. Não me refiro as legitimas e calorosas homenagens a DG, mas sim ao chamado que determinado meio de comunicação de massa fez a sociedade, escalando seus ícones para dizer em cadeia nacional que sua morte representa um problema nacional. Continua...

quarta-feira, abril 16, 2014

Para esquentar os tamborins antes da copa.

Antes de começar a copa do mundo, ainda será possível escrever alguma coisa sobre a sucessão de 2014. Para iniciar, publicarei uma parte do documento que fiquei com a responsabilidade de escrever em preparação ao congresso da CTB-RJ de 2013. As outras serão publicadas no decorrer das semanas e não seguirão a ordem original do texto. Começarei por um breve resumo da evolução do quadro de forças do Estado do Rio de Janeiro. Boa leitura. A crítica é livre. 

UM BREVE RESUMO da DISPUTA POLITICA no ESTADO do RIO de JANEIRO

1)      A primeira vitória de Lula (2002) teve como aliados, no primeiro turno, PCdoB, PL, PCB, PMN e Antony Garotinho, candidato a presidente pelo PSB, no segundo turno. Aqui no Estado venceu Rosinha Garotinho, candidata pelo PSB, em disputa com Benedita pelo PT e Solange Amaral (PFL/PMDB/PSDB). 
2)      A vitória do PSB garantiu a continuidade da politica de rompimento com a estagnação econômica fluminense, principalmente na recuperação da área metalúrgica, em particular a indústria naval, na capital, região metropolitana e Angra dos Reis, iniciada por Antony Garotinho. Infelizmente o reaquecimento deste ramo, embora seu impacto positivo seja visível e significativo, não foi suficiente para reverter o quadro geral na economia do Estado.
3)      Na reeleição de Lula em 2006, a disputa foi com Geraldo Alkmin (PSDB/PFL). Enquanto isso aqui no Estado, Sergio Cabral (PMDB) disputa, no primeiro turno, com a esquerda, Wladimir Palmeira (PT, PCdoB e PSB) e a aliança de direita, Denise Fossar (PPS, DEM e PV). O PSDB lança Eduardo Paes candidato a governador. No segundo turno sai vitoriosa a aliança de centro/conservadora de Sergio Cabral, com apoio da frente de esquerda (PT, PCdoB). Cabral pede voto para Lula no segundo turno. O PMDB passa a ser base do governo federal.
4)      Na eleição de Dilma (2010) o PMDB entra formalmente na aliança, indicando Michel Temer para vice-presidente. Nesta composição o centro da aliança passa a ser PT/PMDB, mudando seu contorno e as contradições no seu interior. É formada uma maioria heterogênea que incorpora forças de esquerda, de centro e até segmentos mais conservadores. No Estado do Rio, Cabral é reeleito no primeiro turno com apoio dos partidos de esquerda da base do governo federal.
5)      Na capital do Rio de Janeiro, centro econômico, do estado, principalmente da região metropolitana, a comando da prefeitura esteve sob controle dos setores de centro/direita, que pese a dança de filiação partidária ocorrida neste período.
6)      Cesar Maia foi eleito em 1992 pelo PMDB, elegeu Conde pelo PFL em 1996, se elegeu novamente em 1999 pelo PTB e se reelegeu em 2004 pelo DEM, perdendo a eleição para Eduardo Paes (PMDB) em 2008, que disputou com seu filho Rodrigo Maia (DEM). Em 2012, Eduardo Paes é reeleito, no primeiro turno, com uma ampla aliança, também heterogênea que incorpora forças de esquerda, de centro e até segmentos mais conservadores.
7)      No Estado do Rio de Janeiro os segmentos de centro e conservadores, ainda são a maioria na aliança, conduzem a maioria das prefeituras e o governo estadual. É preciso ressaltar o crescimento dos partidos de esquerda da base do governo: PT, PCdoB, PSB e PDT. Pela oposição de esquerdista, fato isolado no quadro nacional, o crescimento do PSOL.
8)      É preciso recuperar como esta nova hegemonia foi construída. Uma das teses que a direita, o centro e os e demais conservadores utilizaram para começar a hegemonizar o Estado do Rio de Janeiro foi questionar sua tradição oposicionista. Argumentaram que governos progressistas alimentavam essa postura que teve como consequência o isolamento e a falta de investimento do governo federal e da iniciativa privada.
9)      Outra critica utilizada para construir essa nova hegemonia foi acusar governos de esquerda de populistas, de deixar a violência dominarem a realidade social e de décadas de estagnação econômica do nosso Estado.
10)   Para o bem ou para o mal, a estratégia foi bem sucedida. A expressão politica, contemporânea, dessa hegemonia conservadora esta sintetizada na máxima: união de governos, reforço fiscal e modernização da gestão pública. Esta afirmação é do Governador Sergio Cabral e do Prefeito Eduardo Paes. Esta síntese inicial serve apenas para abrir o debate do desenvolvimento do Estado.